Ninguém tinha muita noção das proporções que o apagão tinha tomado. Incomunicáveis, sem televisão, computador ou telefones sem fio, ficava difícil alcançar que o problema era bem maior e que quase o país todo tinha parado.
Enquanto ninguém tinha ligado para o celular com essa notícia desesperadora a noite estava tranquila e agradável. Embora fizesse calor, as janelas abertas faziam o ar circular, o que, em partes, resolvia o problema.
Então a família se sentou junta para conversar sobre as obras do restaurante, os últimos detalhes de decoração, as cores e os acertos finais. Foi um começo de noite tranquila.
Embora não houvesse música, os sons que vinham da rua soavam muito musicais, o que é uma das maiores vantagens de viver tão longe de civilização (ou, pelo menos, de viver perto de uma fazenda).
Grilos, cigarras, sapos. Todos cantavam uma melodia ensaiada e bastante harmônica, enquanto a voz doce da mãe, contrastada com a áspera rouquidão da voz do pai, acalmavam os corações de filhos tão devotos.
Após horas de conversas gostosas era hora de se recolher. Antes de dormir, era preciso ler um pouco. Clarisse Lispector não pode esperar. A ansiedade corriqueira não permitiria. Num malabarismo ensaiado pousava a vela sobre o corpo e ascendia o livro numa posição que houvesse luz, mas longe do fogo.
Depois de acabar com as únicas duas velas que encotrara, era hora de dormir. Ai começou o problema de estar longe de tudo. O alarme não liga se não tem energia elétrica, e ai vem a preocupação...
Nessa hora o calor começa a ser problema sério. Os latidos dos cães irritam, qualquer som desconcentra, dá medo. Levanta, deita, bebe água, caminha, procura velas, pega lanterna... Noite sem fim!
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